sábado, março 03, 2007

À MINHA ESTÁTUA


É desolador, não ser reconhecido a estima que se tem por estátuas, em quem se investem “fundos” de carinho, amizade e até amor.

A revolta faz com que a alma se desfaça em cascata de dor e se criem ondas incomensuráveis de ódio, que se vão distribuindo por outros seres, que não tendo nada a ver com a situação causada, vão bebendo as palavras agrestes que deixamos vaguear entre os prantos que nos assolam.

Não atendo mais o telefone! Ou o que quer que seja… Disse-o, mas não o fiz, porque sempre senti que faltava coragem suficiente para o fazer.

A estátua de mármore frio, jamais iria ter sensibilidade para perceber o que dizia o meu sentir. Dando encanto e recebendo admiração daqui e dali, apenas fazendo o papel de estátua… uma estátua não tem sentimentos. Uma estátua apenas e vaidosamente recebe, mas não dá nada a não ser a sua imagem: lamentavelmente, personificamos estátuas. Damos-lhes nomes e até nos apaixonamos… e o mármore não ganha cor; não adquire o movimento da mão estendida a acarinhar a solidão…

Sentei-me aqui. Tenho a minha adorada estátua, impávida e fria, na minha frente. Traz um vaso florido, mas não é para mim… será para um novo frequentador deste jardim… a minha estátua vai encantando quem aqui chega de novo, além dos pombos que vão esvoaçando ao seu redor… a minha estátua! A minha estátua nem repara nos velhos admiradores…

Claro que a estátua não é minha. A estátua é deste jardim e de todos os que por aqui passam, deitando-lhe olhadelas de admiração. Admiração passageira. Quem sabe, se depois de virarem o canteiro seguinte, a voltam a recordar?...

Ontem pareceu-me receber o favor de um olhar da minha estátua. Pareceu-me que aquele olhar desdenhoso me era dirigido. Gritou-me como que o eco numa gruta, aquele olhar de soslaio. E ouvi. Ouvi a minha estátua balbuciar uma frase. Uma frase que interiorizei. Até que nem disse mentira (penso eu), ou talvez fosse para me iludir… Por isso hoje voltei a sentar-me no mesmo banco, mesmo à sua frente, para tentar ouvir de novo chamar-me decrépita, dona de uma saudade morta. Mas hoje apenas me votou ao ostracismo… e isso desolou-me. Como pode a minha estátua ignorar que mesmo os velhos têm sentimentos?...


26.02.07

1 comentário:

Diolindinha disse...

Ó vizinha, desculpe lá mas foi a sua imaginação proque as estátuas não falam. Não me preocupe, tá bem?... A vizinha sabe que estou a brincar. Mas também lhe digo que há pessoas piores do que estátuas, duras que nem pedras! Olhe, não fique triste, vem aí a primavera!
Beijinhos e obrigada pela visita!