quarta-feira, julho 12, 2006

ESTA TARDE!


Lúcia (nome fictício) tinha a sessão marcada para as dezasseis horas, mas veio meia hora mais tarde.

Como sempre, muito bem cuidada. Como se diz actualmente, muito produzida. Ares de grande dama, num perfeito faz de conta, porque esta pessoa está a passar um momento de grande perturbação.

Com um casamento com mais de vinte anos e com um filho, que foi viver com os avós para a Suiça, por não querer estudar mais, vê-se diariamente confrontada com o seu papel de mulher fêmea, que a deixa insegura e com uma auto-estima muito baixa.

Lúcia veio para conversar, para ver se encontrava o fio da meada que estava emaranhada há tempo demais.

Apoiar uma pessoa que se refugia em químicos, para não se aperceber que para além de cozinhar as suas pizas, as saladas e limpar o pó, só serve para o marido se satisfazer fisicamente, pois que o senhor em questão, mais culto, vive para a sua profissão e para os seus negócios, que diz serem para manter os luxos da esposa, é extremamente difícil. Mas finalmente, Lúcia entende que toda a sua problemática vida, está contextualizada na sua vida em geral e a sua sensação de não servir para nada que a preencha, tem de ter um fim, pois começou a não aceitar a idade que tem, sentindo-se inútil e admitindo que o marido a vai pôr de parte, encontrando alguém mais jovem e com outros atributos.

Depois de ouvir Lúcia por meia hora, sem a interromper, sugeri que podia ocupar o seu tempo dedicando-se a aprender qualquer coisa que a satisfizesse, para aplicar esse conhecimento em um qualquer hobby, que a fizesse ultrapassar a sensação de vazio.

Sugeri que fizesse voluntariado com crianças ou com pessoas que necessitam de companhia, mesmo sem estarem doentes. Enfim, fui dando pistas, para que daí lhe surgissem ideias, mas sempre aquele olhar distante, como se procurasse algo num ponto indefinido de um espaço que não estava a ver.

Lúcia acabou por se despedir até à próxima semana, dizendo que tinha uma coisa para me contar, mas que para isso tinha de estruturar os mecanismos que a deixassem desinibida e a levassem a ser clara para não entrar em conflito com ela própria, como acontecia muitas vezes…

E…. foi o caso mais marcante desta tarde: há aqui uma velada violência conjugal!

11.07.06

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